Deitei-me durante uma hora e meia, na tentativa de descansar um bocadinho a minha mente e preparar-me para trabalhar. A ideia não era tanto dormir, era mais ficar por uns momentos naquele espaço entre o sono e o acordar, como uma espécie de meditação. Não consegui.
Não consigo dormir há uns meses, a não ser que tome um comprimido. Na verdade, já nem com esse estratagema consigo descansar: a minha cabeça começa a mil, a projectar-me filmes, uns que aconteceram, outros que eu gostava que acontecessem, outros que nem uma coisa nem outra, e no fundo, tudo o que quero é não sonhar, é descansar apenas, e não consigo.
Podia mentir a mim mesma, e dizer que não entendo o que se passa. Podia tomar um remédio mais forte, tentar fugir para mais longe, rir mais alto, brincar ao faz-de-conta para ver se isto passava. No entanto, eu não sou esse tipo de pessoa. Já fui, mas estou farta dos esquemas em que tanto se mente, e tanto se começa a acreditar nas mentiras que, às tantas, já não se sabe bem quem somos. Se tu és assim ( e ao dizer “tu”, estou a falar genericamente), e se funciona, óptimo. A ver até quando...
No dia 1 de Novembro de 2008, por volta do meio-dia, enchi-me de coragem e disse à pessoa com quem queria passar o resto da minha vida que, afinal, as coisas não eram bem assim. Esta frase que acabei de escrever não acrescenta nada de novo a muitos outros textos que já escrevi aqui, e é uma história antiga. Não será nada de novo dizer também que foi uma decisão ponderada – mas não menos difícil – que implicou uma mudança violentíssima na minha vida. Foram seis anos de uma relação que teve óptimos momentos ( e péssimos também...), uma relação que me levou para fora de Portugal e na qual havia planos de futuro. Por causa da decisão que tomei, tive de regressar para onde eu tinha prometido a mim mesma que não voltaria; tive de recomeçar uma estrutura social e profissional; tive de enfrentar um sempre eterno medo de estar sozinha.
Hoje, dia 11 de Outubro de 2009, culmina (ou começa, nem sei muito bem) um processo de auto-entendimento que é fundamental para evitar uma tendência que sempre tive para a auto-destruição.
Começa com o afastar definitivo de um complexo de culpa enorme que tenho sentido ao longo de todos estes meses, racionalizado no facto de, se fui eu quem terminou, então tenho de estar lá em cima a nível de estado de espírito. Não, não estou. Estou a sofrer por dentro como nunca pensei ser possível sofrer-se por amor. Eu sei que nós fizemos tudo o que nos era possível para salvar a nossa relação, mas nós eramos demasiado teimosos, demasiado apegados, demasiado aquele ser bicéfalo em que duas pessoas se tornam quando se amam. Um amigo meu, mais sábio do que aquilo que ele poderá imaginar-se, disse-me outro dia: o problema não está no facto de a relação acabar, está no facto de olharmos para trás e percebermos que as coisas não funcionaram. Eu queria tanto que funcionasse...but it was broken.
Baseando-me então no falso pressuposto de que, se fui eu quem terminou, então tenho de estar lá em cima a nível de estado de espírito, entrei a mil na minha nova vida. Não tinha tempo para arrependimentos, para sofrimentos e outros “mentos”, porque afinal, o tempo passa a correr e eu queria correr com ele. Fiz o do costume: anestesiar-me com álcool, porcarias e outros gajos. E, como qualquer pessoa partida ao meio, esperar demasiado das pessoas. Desses outros gajos. Dizia para mim mesma que, por mais que soubesse que se aproveitavam da minha fragilidade, eu também me aproveitava deles, e que ao menos me divertia. Se, por um lado, há o seu quê de verdade neste pensamento, a imagem em grande é que estive a acumular dor por cima de dor, para fazer com que a verdadeira dor se fosse embora. Claro que não foi.
Admitir isto é das coisas mais difíceis que alguma vez fiz na minha vida, tão ou mais difícil como deixar o meu ex-namorado. Foi toda uma vida nova, boa, positiva, construtiva, que foi ao ar. E, em consequência, tenho acumulado merda por cima de merda.
Não tenho alternativa senão parar de fugir e assumir o luto. It's broken, não há nada mais para onde voltar. Nem tão-pouco desejo voltar para uma pessoa que, por muito que tenha qualidades, tem defeitos que não posso tolerar. Não mudaria nada agora, nem nunca. Foi uma boa decisão, mas o que se seguiu é que não foi.
Então, o que se segue?
Uma mudança de vida radical. O luto, perdoar-me e assumir que tenho de fazer mesmo tudo de novo. Ser uma pessoa boa para mim, consciencializar-me de que quem decide sou eu, e decidir tendo em conta que, se estou doente do coração, não me faz bem ter atitudes que me debilitam.
Não vou voltar a esperar dos outros aquilo que nem eu mesma me posso dar. Não vou entrar por um caminho de auto-destruição, porque a culpa me diz que, no fundo, é isso que eu mereço. E tenho de parar de tentar estar em dois sítios ao mesmo tempo, na vida que era suposto ter tido, e naquela em que estou agora mesmo. Mais, vou parar de tentar ser uma estrela de rock na vida presente; ser apenas eu é muito mais complicado, mas muito mais verdadeiro.
It was broken, couldn't be fixed. But I can still fix myself...